Às vezes tenho a sensação de andar em um grande e cheio ônibus de
viagem, repleto de passageiros que exibem nas mãos seus bilhetes com destino
certo. Eu entro e sento em um banco qualquer, sem saber ao certo qual o meu
lugar, talvez com a ideia de tentar me encaixar em qualquer espaço vago naquele
veículo que já tem quilometragem acima da média. Eu olho aquele espaço vago e
tento me espremer, me esgueirar para olhar pela janela, tentando saber qual a
rota seguida pelo motorista. Não consigo descobrir. Cheguei atrasada. Não
sentei na janela, na verdade nem sei qual o meu lugar. Não tenho bilhete.
Entrei por acaso no ônibus e não sei qual destino seguir. Sou conduzida pela
multidão que se aperta entre dos bancos e corredores. Sou induzida a seguir
viagem mesmo sem saber para onde ir, muito menos onde desembarcar.
Durante a viagem a sede aperta.
Não tenho água. A fome chega e não há sequer um biscoito em minhas mãos. Não
tenho bagagem. Não tenho nada. Nem ao menos sei por que motivo entrei no
terminal rodoviário e escolhi esse ônibus. Dias depois todos que estão com
seus bilhetes se preparam para descer em seus destinos, menos eu, que continuo
sem saber o que fazer. Não sei para onde ir e depois de tantas viagens descubro
que o endereço de partida está quase se apagando. O que mais me angustia é a
sensação ansiosa de não saber qual será a imagem do ponto final. Não saber o
local de desembarque e o que fazer após descer do ônibus me causa arrepios.
Tento ler nos bilhetes alheios um sinal de familiaridade, mas só encontro
coisas que não fazem o menor sentido. Olho novamente o bilhete do colega ao
lado e tento me imaginar desembarcando em seu destino. Me imagino andando por
aquelas ruas, vendo aquela paisagem, comprando casa, trabalhando e tendo uma
vida naquele lugar. Me vejo feliz por um tempo, mas logo depois percebo que não
há mais nada além de pura divagação. Minha imaginação mais uma vez me leva a
outro destino, muito melhor que o primeiro. Lá o sol brilha mais, há mais cor e
sabores inesquecíveis. Me vejo de frente para o mar e a água acariciando os
meus pés. O sol esquenta percebo que não sou muito adepta ao verão, e minha
pele concorda. Durante o trajeto minha mente se dispersa mais algumas vezes
tentando se encaixar em cenários alheios sem obter sucesso.
O que fazer se não se sabe para onde vai? Onde desembarcar, afinal? Gostaria tanto de saber...(continua...)