quarta-feira, 4 de julho de 2018

Ônibus 29 – As janelas estão abertas


As janelas estão abertas...



Na verdade sempre estiveram, e eu permanecia tão sufocada em meu próprio sofrimento, que não conseguia visualizar a beleza que vinha do lado de fora. 
Depois de tentar me encaixar em tantas rotas, bancos e bilhetes, não poderia imaginar a paz de contemplar a viagem. Simplesmente contemplar. Viajar...

O ônibus 29 passeava pelas estradas como quem apenas vive e não como quem espera ansiosamente a parada final.

Ansiedade.
Esse tal bichinho mentiroso que te captura ao longo da viagem e que tenta a todo custo de desviar da rota. Bem insistente, ele consegue causar dor física se for alimentado corretamente. 

Coloco meus fones e ligo na tal música que me acalenta a alma, como uma coberta de emoções boas que surge logo nas primeiras notas. Escorrego para o banco próximo à janela, que estava vago há tempos, mas os óculos das frustações não me permitia enxergar. Recosto minha cabeça no vidro salpicado pelas gotas de chuva. Aquelas gotículas geladas, que escorrem pelo vidro lentamente, como se dançassem ao som da minha música favorita chamada calmaria.

As curvas da estrada começam a não passar tanto medo, e a velocidade do ônibus em cada uma não me importa mais. Aos poucos eu descubro que já haviam computado o destino da minha passagem, só não tinham me avisado, talvez para que não fosse mordida novamente pelo animalzinho asqueroso da ansiedade. Em resumo, foi apenas proteção.

Parando para pensar eu nunca perguntei tão avidamente quanto nesta turnê. De todas as viagens, os ônibus que peguei e estradas que passei, com certeza essa foi a mais angustiante e duvidosa, pois estava alimentando os monstrinhos sugadores, e não abrindo os olhos e ouvidos para aquilo que o motorista estava avisando. Mas ele estava lá, gritando meu nome. Como fui tola.

A certa altura decido conversar com o condutor. Ele parecia tão tranquilo que podia até ouvir cantarolar uma canção. Desligo a música no celular, mas não de dentro da mente e continuo cantando os acordes finais daquela que mais gosto.
Levanto e sigo até a parte frontal do veículo.
— Oi, motorista.

(Continua...)


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