As janelas estão abertas...
Na
verdade sempre estiveram, e eu permanecia tão sufocada em meu próprio
sofrimento, que não conseguia visualizar a beleza que vinha do lado de
fora.
Depois
de tentar me encaixar em tantas rotas, bancos e bilhetes, não poderia
imaginar a paz de contemplar a viagem. Simplesmente contemplar. Viajar...
O ônibus 29 passeava pelas
estradas como quem apenas vive e não como quem espera ansiosamente a parada
final.
Ansiedade.
Esse tal bichinho mentiroso que
te captura ao longo da viagem e que tenta a todo custo de desviar da rota. Bem
insistente, ele consegue causar dor física se for alimentado corretamente.
Coloco meus fones e ligo na tal
música que me acalenta a alma, como uma coberta de emoções boas que surge logo
nas primeiras notas. Escorrego para o banco próximo à janela, que estava vago
há tempos, mas os óculos das frustações não me permitia enxergar. Recosto minha
cabeça no vidro salpicado pelas gotas de chuva. Aquelas gotículas geladas, que
escorrem pelo vidro lentamente, como se dançassem ao som da minha música favorita
chamada calmaria.
As curvas da estrada começam a
não passar tanto medo, e a velocidade do ônibus em cada uma não me importa
mais. Aos poucos eu descubro que já haviam computado o destino da minha
passagem, só não tinham me avisado, talvez para que não fosse mordida novamente
pelo animalzinho asqueroso da ansiedade. Em resumo, foi apenas proteção.
Parando para pensar eu nunca
perguntei tão avidamente quanto nesta turnê. De todas as viagens, os ônibus que
peguei e estradas que passei, com certeza essa foi a mais angustiante e
duvidosa, pois estava alimentando os monstrinhos sugadores, e não abrindo os
olhos e ouvidos para aquilo que o motorista estava avisando. Mas ele estava lá,
gritando meu nome. Como fui tola.
A certa altura decido conversar
com o condutor. Ele parecia tão tranquilo que podia até ouvir cantarolar uma
canção. Desligo a música no celular, mas não de dentro da mente e continuo
cantando os acordes finais daquela que mais gosto.
Levanto e sigo até a parte
frontal do veículo.
— Oi, motorista.
(Continua...)
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